A trajetória de Christopher Nolan até Dunkirk | Parte 1


Christopher Edward Nolan, o cineasta britânico de 46 anos é um anacronismo na era do 3D, dedicado a arte de fazer cinema de sua forma mais clássica. Um apreciador de efeitos práticos ao invés de computação gráfica e, sobretudo, um criador de verdadeiras epopeias cinematográficas. Assistir a um filme do diretor é imaginá-lo como um maestro de uma grande ópera.

Nolan começou sua carreira nos longas com Following (o filme nunca estreou oficialmente no Brasil), em 1998, um suspense criminal que conta história de Bill, um escritor desempregado que busca nas pessoas do dia a dia a inspiração para as suas obras. Ele as segue e, com isso, conhece Cobb, um ladrão que percebe estar sendo perseguido pelo escritor. A partir daí a narrativa se desenrola.

Following é a única obra de Nolan inteira em preto e branco, uma opção que insere um senso "noir" e aumenta a noção de suspense. O filme também conta com uma continuidade não-linear, algo que viria a se tornar uma das marcas registradas do diretor, que usa e abusa das viradas de roteiro, os famosos "plot-twists". Um longa gravado com poucos recursos, nada que chegue perto dos valores astronômicos que custam suas produções atuais, mas isso não atrapalha a imersão que o filme proporciona, inserindo um caráter "cult" a obra.

Following, 1998

Foi então que, em 2000, Nolan estreia Memento (no Brasil, "Amnésia"). Sua primeira grande parceria com seu irmão Jonathan Nolan (um dos criadores de Westworld, série original da HBO). 

Baseado em um conto de Jonathan, Memento conta a história de Leonard Shelby (Guy Pearce) um homem que, após um grande trauma (o assassinato de sua mulher), manifestou uma doença chamada amnésia anterógrada (perda de memória para eventos que ocorrem posteriormente ao acontecimento da doença) e vive em busca de vingança. O personagem tem o corpo coberto de tatuagem, tentando desesperadamente marcar na pele as memórias que não pode manter em sua mente.

Aqui o diretor repete a não linearidade, mas do ponto de vista de seu personagem principal. Sendo assim, o espectador descobre o que está acontecendo conforme Leonard faz suas descobertas. Memento é apresentado em duas sequências diferentes de cenas: uma série em preto e branco que é mostrada cronologicamente e uma série de cenas coloridas que são mostradas em ordem reversa. As duas sequências se "encontram" no final do filme, produzindo uma única história em comum. Essa narrativa complexa se encaixa perfeitamente e nos dá um trabalho perfeito, não visto no cinema até então. Aqui, Nolan começa a trabalhar com atores mais conhecidos da indústria, além de Guy Pierce (Prometheus) temos Carrie-Ane Moss (Matrix) e Joe Pantoliano (The Sopranos).

Memento, 2000

Dando sequência a sua carreira, agora já fixada em Hollywood e na Warner, o cineasta lança em 2002 o filme, Insomnia (no Brasil, Insônia). Trata-se de um remake de um thriller psicológico norueguês homônimo de 1997. Ele conta a história de dois detetives de homicídios de Los Angeles que investigam um assassinato em uma cidade do Alasca, na época do ano em que lá não anoitece.

A grande sacada do diretor está na escolha do elenco, onde encontramos uma inversão muito interessante. Al Pacino (consagrado por seus papéis como mafioso) é o “mocinho”, embora controverso e cheio de remorsos que permeiam a trama. Robin Willians (eterno bom moço) é colocado na figura do vilão. Essa dissonância entre o “bem" e o "mau” injeta um novo conteúdo a trama e nos dá um suspense policial, interessante e subversivo, embora seja o filme menos ambicioso do diretor.

Ainda assim, Insomnia fecha essa primeira trilogia de Nolan. Os filme não tem qualquer ligação narrativa, mas todos permeiam de forma magistral a psique humana, suas falhas e motivações, algo que continua a ser uma constante em seus filmes. 

Insomnia, 2002

Agora estabelecido e com prestígio dentro da Warner, Christopher Nolan, receberia um novo universo para trabalhar. Um universo já estabelecido dentro e fora dos cinemas e que carrega um dos personagens mais importantes para a cultura pop moderna. Batman se tornou a nova empreitada do diretor, que se mostrou um fã, trabalhando com o maior esmero possível. Apesar da importância do Homem Morcego, a franquia não vinha bem cinematograficamente desde que Batman & Robin de Joel Schumacher (Tempo de Matar) fora lançado. 

Nolan trouxe uma nova roupagem para o Cavaleiro das Trevas, mais sombria, densa e fiel aos quadrinhos do morcego de Gotham. Ele inicia essa nova e revigorante franquia com uma história de origem. Tudo aqui é muito bem explicado, desde as motivações de Bruce Wayne, até o treinamento do Batman. A opção por mostrar essa transformação e passar quase metade do filme nela, se torna essencial para humanizar a história. Chegando ao fim, o espectador fica convencido da veracidade e da possível existência do personagem na realidade em que vivemos.

Christian Bale (Trapaça) é um Batman verossímil e cheio de nuances, até hoje um dos melhores interpretes do personagem. Michael Caine (Despedida em Grande Estilo) é um Alfred humano, engraçado e paternal. Liam Neeson (Simplesmente Amor) se encaixa bem como mentor, nos dando um sentimento de perda quando o vemos ser o verdadeiro vilão da história. Gary Oldman (Drácula de Bram Stoker) como Gordon está perfeito. Morgan Freeman (Lucy) como Lucius Fox agrega mais camadas a veracidade da trama.

Batman Begins, 2005

Finalizando essa primeira parte da filmografia do diretor, temos The Prestige (no Brasil, O Grande Truque) um filme mágico, com o perdão da piada infame. O roteiro trata de dois mágicos rivais que são obcecados por criar o maior truque mágico já visto. Trata-se da adaptação do romance homônimo escrito por Christopher Priest e lançado em 2006.

Temos aqui uma excelente construção de época, o único filme do diretor que não se passa tem tempos contemporâneos (a exceção é seu próximo lançamento, Dunkirk) As atuações de Chistian Bale, Hugh Jackman (Logan) e Scarlett Johansson (Os Vingadores) são excelentes. O elenco conta ainda com a cereja do bolo, David Bowie, como Nicolas Tesla.

Uma obra sobre rivalidade, limites para a obsessão e a busca pela perfeição. Um excelente sci-fi, que estabeleceu Nolan no gênero que parece ser seu favorito. Aliás, o que seria da ficção científica moderna sem Nolan? Filmes como A Origem e Interestelar deram um novo fôlego para a temática, criando todo um novo contexto a ser abordado e colocado nos holofotes. Mas isso é assunto para a nossa parte 2.

The Prestige, 2006

Comentários