CRÍTICA | Absorvendo o Tabu

Direção: Rayka Zehtabchi
Elenco: Ajeya, Anita, Gouri Choudari, entre outros
Origem: EUA
Ano: 2018

“Não acredito que um filme sobre menstruação ganhou um Oscar.”

Foi com essa frase que a diretora Rayka Zehtabchi (We Home) celebrou o prêmio de melhor curta-documentário por Absorvendo o Tabu (Period. End of Sentence.), obra que explicita os impactos do machismo em uma das fases mais importantes da vida de uma mulher.

Em muitos lugares, a menstruação é entendida como um processo natural do corpo feminino, ainda assim o sentimento de vergonha acompanha muitas mulheres. Pergunte a qualquer garota adolescente o seu maior medo durante os dias da menstruação. Provavelmente a resposta irá variar entre o absorvente vazar ou os garotos da escola perceberem que ela está “naqueles dias”. Agora imagine a situação das meninas e mulheres na Índia, país que associa a menstruação a impureza, ou até mesmo a uma maldição.

Em Absorvendo o Tabu conhecemos a realidade vivida pelas mulheres do Distrito de Harpur, interior da Índia, onde o estigma da menstruação persiste, assim como no restante do país. Todos os assuntos relacionados a saúde da mulher são invisibilizados, contudo, a menstruação segue sendo o maior tabu. Proibidas de rezar nos templos, afastadas do convívio social e com vergonha de ir a escola, as indianas enfrentem as mais básicas dificuldades em um mundo que se fecha para elas todos os meses. Essa cultura, no entanto, começa aos poucos a mudar.

Foto: Netflix

O curta-documentário retrata o processo de implementação de uma máquina que produz absorventes biodegradáveis, gerando independência financeira para as mulheres que passaram a trabalhar na fábrica, melhorias nas condições de saúde e higiene e, é claro, promovendo uma abertura para o debate sobre o assunto.

A discussão aqui se mostra indispensável, porque o tabu e a vergonha são elementos muito fortes na Índia. Um estudo publicado em 2014 pela BBC, e realizado por um fabricante de absorvente, mostra que 75% das mulheres indianas ainda compram o produto envolto em embalagens marrons ou jornais, por pura vergonha, e jamais fazem isso na frente de um homem. Isso sem contar o número altíssimo de cerca de 3 milhões de mulheres que abandonam a escola motivadas, novamente, pela vergonha da primeira menstruação.

Na obra é possível perceber que sempre que a palavra “menstruação” é citada, ela vem seguida de risadas e muito desconhecimento. Enquanto um grupo de homens acredita que menstruação é uma doença, algumas mulheres só sabem que ela está associada a gravidez, já em uma turma de escola, poucos sabem o seu significado. O silêncio reina e é ele que deve ser combatido.

A único ponto negativo de Absorvendo o Tabu é o fato de não explorar como deveria a ineficiência da saúde pública e o papel que o Estado tem na melhoria de condição de vida das mulheres. Ainda assim é uma produção extremamente necessária, nos apresentando uma realidade que não podemos ignorar. Se no Brasil a moda é usar coletor menstrual ou calcinhas especiais para o período, na Índia, as mulheres ainda estão lutando pelo acesso básico a saúde e higiene, pelo direito de usar absorvente e não serem segregadas. Isso é empoderamento! Muito mais do que um crescimento individual ou uma nova opção de produto para comprar, empoderar uma mulher significa dar, a todas elas, as condições necessárias para uma vida plena.

Foto: Netflix

Absorvendo o Tabu foi produzido pela The Pad Project, uma organização que atua na Índia para o fim do tabu da menstruação. E se você quer entender mais sobre o tabu cultural existente no país, recomendo a reportagem postada pela BBC.

Ótimo

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