CRÍTICA | Rainha de Copas

Direção: May el-Toukhy
Roteiro: May el-Toukhy e Maren Louise Käehne
Elenco: Trine Dyrholm, Gustav Lindh, Magnus Krepper, entre outros
Origem: Dinamarca / Suécia
Ano: 2019

" - Conheci uma mulher extraordinária. Ah, meu caro, faltam-me as palavras certas para defini-la... Tudo nela é luz!
Achei um exagero. Onde há luz, há sombras."

O trecho acima - retirado de um dos romances do angolano José Eduardo Agualusa - resume bem uma das facetas da narrativa de Rainha de Copas (Dronningen), longa-metragem dinamarquês vencedor do Prêmio do Público no Festival de Sundance deste ano.

A trama acompanha a vida de Anne (Trine Dyrholm), uma advogada dedicada à casos de violência contra crianças e jovens. Mas para além de sua profissão, o público é levado também a mergulhar na vida pessoal e familiar da protagonista. E é na contradição evidente entre essas duas esferas que mora a força motriz da narrativa.

O filme explora a criação - e as consequências irreparáveis - de um segredo de família. A princípio, Anne vive uma vida quase perfeita com o seu marido Peter (Magnus Krepper) e as filhas gêmeas. No âmbito profissional, a mulher também é muito bem-sucedida, buscando justiça para crianças e jovens violentados e ganhando reconhecimento pela sua atuação. Contudo, tudo muda com a chegada de Gustav (Gustav Lindh), seu enteado adolescente. Sucessivas decisões erradas acabam carregando toda a família para um infeliz destino, que, ao final do longa, deixa o público com um nó na garganta.

Foto: Arteplex Filmes

Vale a pena destacar o roteiro, que constrói e desenvolve uma protagonista bastante interessante. A personalidade de Anne vai aos poucos ganhando complexidade, à medida que a personagem comete faltas e toma atitudes moralmente duvidosas. Da mesma forma, seu posicionamento frente aos seus próprios erros e às odiosas consequências, também demonstram as vários nuances da personagem. Nesse ponto, a direção da cineasta May el-Toukhy (Moral da História) - que também escreve o roteiro - ressalta esse aspecto na sua criação.

Nas palavras da diretora, Rainha de Copas explora o quão longe estamos dispostos a ir, uma vez que as escolhas são feitas para proteger nós mesmos e manter o status quo de nossa existência. O reconhecimento dessa dualidade do ser humano, que não é movido apenas pela lógica, mas também pelos seus sentimentos e instintos mais básicos, é um dos aspectos mais interessantes do longa. O que justifica que a mesma pessoa tome atitudes aparentemente contraditórias em diferentes momentos de sua vida. Certamente Anne fará o espectador lembrar de seus próprios momentos.

Enfim, Rainha de Copas é um ótimo drama familiar que - apesar de abordar temáticas usuais - não apela para fórmulas baratas. Capaz de prender a atenção do público com uma atmosfera de tensão contínua.

Ótimo

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