CRÍTICA | Bohemian Rhapsody

Direção: Bryan Singer
Roteiro: Anthony McCarten
Elenco: Rami Malek, Gwilym Lee, Joseph Mazzello, Ben Hardy, Lucy Boynton, Aidan Gillen, entre outros
Origem: Reino Unido / EUA
Ano: 2018

"Somos quatro desajustados que não se encaixam, tocando para outros desajustados, os excluídos lá no fundo do salão que sabem que não se encaixam também. Nós nos encaixamos neles."

Tem cantores e bandas que são destinados a marcar a história da música mundial, levando seu repertório  através de gerações. Sem dúvida o Queen fez isso com maestria. Ninguém pode negar que a banda trouxe um estilo de rock revolucionário, sempre se propondo a ser diferente, ambiciosa, sem seguir fórmulas ou trazendo repetições. E grande parte dessa ideia vinha de seu vocalista Freddie Mercury, que em meio a todas as suas frustrações internas, conseguiu externar todo o seu talento e fazer uma carreira de sucesso que marcou a vida de milhões. A biografia musical Bohemian Rhapsody mostra essa jornada escandalosa e ousada, como seu vocalista foi. 

Dirigido por Bryan Singer (X-Men: Dias de um Futuro Esquecido) e escrito por Anthony McCarten (O Destino de uma Nação), o longa começa de forma emblemática, com a canção “Somebody to Love” e Freddie (Rami Malek) acordando em sua mansão cheia de gatos de estimação, a caminho do hoje histórico show Live Aid, em 1985, em um Wembley abarrotado de gente.

Logo em sua apresentação é perceptível a solidão que sempre foi muito presente na vida do protagonista, que claramente nutria de uma espécie de falta de amor próprio e aceitação de si mesmo. Em seguida retornamos para os anos 70, quando o jovem Farrokh Bulsara (seu nome de batismo) vaga pelos subúrbios londrinos. Daí ao Queen é um pulo, grande demais inclusive: ele assiste ao show da banda, vai elogiar os caras e é informado que o vocalista deixou o posto. E pronto. O icônico grupo estava formado.

Foto: Fox Film do Brasil
A obra apresenta alguns saltos temporais, obviamente para poder contar a trajetória de Mercury na banda, mas alguns soam muito bruscos, sem dar tempo para aprofundar as relações dos integrantes do grupo, por exemplo. Na verdade, a obra apresenta alguns problemas no roteiro justamente devido ao seu recorte temporal extenso, evidenciando algumas imprecisões históricas. Um exemplo é a cena que ocorre em 1975, na qual vemos o cantor explicando que “Love Of My Life” foi escrita para Mary (Lucy Boynton), o “amor de sua vida”, enquanto na TV aparecem imagens do marcando show da banda no Rock in Rio. O problema é que o show em questão ocorreu apenas 10 anos mais tarde, em 1985. Para quem é fã assíduo e conhece a história do Queen, isso pode incomodar um pouco.

No entanto, o texto consegue apresentar algumas boas inserções musicais, como quando “Love of My Life” volta a tocar ganhando função narrativa, representando Freddie e Mary acabam se separando, ou quando John Deacon (Joseph Mazzello) apresenta “Another One Bust the Dust” enquanto acontece uma discussão entre os membros da banda.

Bohemian Rhapsody tem momentos que emocionam o espectador, sendo fã ou não do Queen, como quando o ambicioso vocalista discute com um produtor musical sobre a faixa icônica que dá nome à produção. O produtor duvida que a canção de seis minutos conquistará o público e prefere que a banda se atenha a fórmulas pré-estabelecidas. Já Mercury e seus companheiros tentam convencê-lo do oposto, dizendo que eles queriam ser experimentais, não significando uma coisa só, misturando gêneros, trazendo o elemento de tragédia grega, rebatendo que a mistura experimental de rock e ópera seria um hit, além de uma obra-prima. E a sorte favoreceu os ousados, no final das contas. Essa cena exemplifica o que o Queen representa, o que a banda é em sua essência. 

Foto: Fox Film do Brasil

Mas a melhor coisa do filme, sem dúvida, é a atuação de Rami Malek (Mr. Robot), que entrega todos os trejeitos, olhares, danças, sotaque, ironia e o jeito único de Freddie Mercury, conquistando o público não apenas pela semelhança física, mas por demonstrar em tela o magnetismo que o artista tinha no palco. Para ser Freddie Mercury era preciso entender Farrokh Bulsara. E Malek parece ter compreendido isso.

A cena em que o ator mais se destaca é o da icônica apresentação da banda no Live Aid, já citada aqui, onde ele é a personificação viva do cantor no palco. E quanto ao alcance vocal, o dote mais particular do artista, o ator teve sua própria voz mixada à de Mercury e outro cantor, e o resultado consegue ser convincente em cena, sem soar como um mero playback. Além disso, a fotografia, maquiagem, cabelo e figurino nos remetem muito às décadas em que a história se passam, conseguindo transportar o público para a época.



Trata-se de um longa-metragem que fala sobre a vida. As cenas dos concertos são contagiantes, porque Freddie Mercury era contagiante e Malek, como o personagem, assume monstruosamente esse papel. Escandaloso, exótico, esquisito, que negava a sua origem, a sua sexualidade e se sentia um desajustado, foi capaz de criar uma experiência musical incompreendida a princípio, entre os seus “momentos de escuridão”. Um artista artista que deu às pessoas o que elas queriam, sempre causando impacto e querendo fazer melhor com o seu talento.

Foto: Fox Film do Brasil

Mesmo com seus problemas, Bohemian Rhapsody é uma experiência deliciosa, hipnotizante e apaixonante, comandada por um ator grandioso que desaparece dentro do protagonista, com uma trilha sonora inesquecível e uma conclusão digna da importância do Queen.

Ótimo

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