CRÍTICA | O Enigma de Outro Mundo

Direção: John Carpenter
Roteiro: Bill Lancaster
Elenco: Kurt Russell, Wilford Brimley, Keith David, T.K. Carter, David Clennon, entre outros
Origem: EUA
Ano: 1982


A palavra "gênero" está sempre presente quando debatemos sobre particularidades de dois ou mais indivíduos, produtos ou obras que compõem algum segmento específico por possuírem elementos em comum. Essa designação é uma forma de facilitar a identificação de grupos característicos, os quais também sempre possuem as famosas referências como demonstração do que é discutido. No universo cinematográfico não é diferente. Quando falamos de terror, é fundamental que o nome de John Carpenter (Fuga de Nova York) seja citado e reverenciado, eternizado por dirigir o clássico Halloween: A Noite do Terror (1978), considerado um dos maiores exemplares do gênero.

Dando continuidade a uma sequência de produções nas décadas de 1970/80, um dos grandes exemplares de sua filmografia é O Enigma de Outro Mundo (The Thing). À época de sua estreia nos cinemas, o longa não ganhou o devido destaque por dividir a atenção do público com outros clássicos, como E.T.: O Extraterrestre (1982), de Steven Spielberg, e Blade Runner (1982), de Ridley Scott. Se o primeiro foi o verdadeiro "queridinho" do momento e o segundo só conquistou maior compreensão do espectador anos depois, imaginem a experiência surreal causada pelo filme de Carpenter - que é uma nova versão do livro de John W. Campbell, sem deixar de lado as referências à primeira adaptação cinematográfica: O Monstro do Ártico (1951), de Christian Nyby e Howard Hawks.

Logo em sua primeira sequência a produção desperta curiosidade imediata: um helicóptero perseguindo um cachorro a tiros no inverno da Antártica. Se isso já não é motivo suficiente para causar estranheza, a ação se estende para uma base habitada por pesquisadores norte-americanos que também estão no continente realizando um estudo, e acabam surpreendidos pelo ataque ao animal. Em uma troca de tiros entre o perseguidor e o pessoal da base, logo se descobre que aquele helicóptero é de um grupo norueguês e, assim, começam os questionamentos a fim de entender a motivação do ataque ao cão e o descontrole do homem a bordo da nave.

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Enquanto isso, o cachorro acaba se tornando mais um animal sob os cuidados dos norte-americanos. A partir daí começam os problemas, pois aquele ser vivo é qualquer coisa, menos um cão. Isso fica evidente assim que o animal perseguido sofre uma mutação, transformando-se em um ser de aspecto grotesco e totalmente deformado em questão de minuto, atacando os outros cães que estavam por perto. Logo os pesquisadores ligam os pontos e entendem que herdaram uma descoberta realizada pela base norueguesa, a qual "desenterrou" algo que estava congelado há anos, e que matou todos os componentes que lá estavam.

Por meio de alguns estudos, um dos pesquisadores identifica que aquele ser vivo consegue assimilar qualquer outra forma - de animais a seres humanos. Ou seja, ele se transforma na aparência que desejar e assume o controle do ser hospedeiro até que consiga alastrar sua contaminação em mais pessoas. E é isso que aqueles homens precisarão evitar a todo custo, inclusive deixando a própria sanidade de lado.

Imagine a tensão criada pelo medo de que a pessoa ao lado esteja contaminada pela "coisa" e se transforme a qualquer momento, somada ao isolamento no rigoroso inverno e nenhum sinal de resposta por parte da base de resgate. É esse o clima O Enigma de Outro Mundo. E é dessa forma que desenvolve-se a relação entre aqueles homens, que deixam de ser companheiros de pesquisa para tornarem-se paranoicos entre si. A desconfiança se instala completamente assim que a "coisa" começa a agir através de algum humano infectado, ocasionando desentendimentos e levando a fins trágicos entre os homens.

O "cabeça" do grupo é o piloto MacReady (Kurt Russell), o qual serve como um guia para entendermos o desenvolvimento da criatura entre os homens da base, também atuando como um termômetro da paranoia presente. Todo essa atmosfera afeta diretamente o espectador, que fica confuso, exigindo atenção aos mínimos detalhes indicados pela incrível direção de Carpenter, somada ao inteligente roteiro de Bill Lancaster (Garotos em Ponto de Bala), que é explicativo em fundamentos importantes da proposta ficcional, mas respeita a intenção do mistério até seu inesquecível desfecho.

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Além do clima de suspense martelando constantemente com a trilha sonora crescente de Ennio Morricone (Os Oito Odiados), toda a parte técnica de efeitos visuais e maquiagem tornam a experiência visual um verdadeiro show de horror. A "coisa" vai assumindo novas formas - cada vez mais nojentas e improváveis - e ainda nos dias de hoje o impacto visual é de total desconforto. É de se pensar como foi a recepção do público para algo tão bizarro na época, o que justifica o status cult adquirido pelo filme com o passar dos anos, devido ao ótimo envelhecimento da história e da alta qualidade dos próprios efeitos.

Não dá dúvidas de que a ficção científica e o horror combinam demais quando bem direcionados, e O Enigma de Outro Mundo é prova do resultado formidável alcançado com a junção desses dois gêneros, principalmente com a construção paralela de duas linhas de terror: o psicológico, presente nos conflitos e paranoia dos personagens; e o visual, proveniente do rico trabalho de concepção e efeitos visuais transpostos em imagem, som e movimento. Essa fusão tão bem desenvolvida criou este trabalho, que é um dos melhores da década de 1980 e um clássico enfim reconhecido.

Excelente

  

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