CRÍTICA | Yojimbo, o Guarda-Costas

Direção: Akira Kurosawa
Roteiro: Akira Kurosawa e Ryûzô Kikushima
Elenco: Toshirô Mifune, Tatsuya Nakadai, Yôko Tsukasa, Isuzu Yamada, entre outros
Origem: Japão
Ano: 1961

Nessa vida cinéfila, com tantos títulos para se assistir, tem sempre um diretor renomado que você fica em dívida. No meu caso, Akira Kurosawa (Os Sete Samurais) é um deles. Me faltaram oportunidades para assistir seus filmes, até pela escassez de suas obras nos serviços de streaming disponíveis no Brasil, mas, felizmente, pude começar a resolver essa pendência através do Belas Artes À La Carte, que me ofertou a possibilidade de conferir o seu mais recente lançamento do catálogo: Yojimbo, o Guarda-Costas (Yojinbo), lançado originalmente em 1961.

Na trama, um ronin astuto (Toshirô Mifune) está de passagem por uma cidade que sofre dividida por duas gangues de criminosos. Ele então decide ajudar os moradores jogando uma gangue contra a outra, na esperança de libertar a cidade e ganhar um bom dinheiro em troca.

A grande força de Yojimbo está no personagem central vivido por Toshirô Mifune (Rashomon), ícone japonês que protagonizou diversos exemplares da filmografia de Kurosawa. O ator - de enorme presença e carisma em tela - confere toda uma "malandragem" e inteligência ao ronin, conquistando o espectador de imediato. Um bom exemplo está na cena em que o samurai observa do alto, com um enorme sorriso no rosto, as gangues se encarando e temendo entrar em conflito. O olhar isento do forasteiro faz com que enxerguemos o quão ridículos são os embates, trazendo um tom bem-humorado e muito bem-vindo à obra.

Não por acaso, Kurosawa resolveu adaptar o roteiro de seu longa-metragem seguinte - que já estava em pré-produção - para incluir o personagem. Além disso, é notável a influência do western norte-americano na visão do cineasta para Yojimbo, especialmente de obras como Matar ou Morrer (1952) e Os Brutos Também Amam (1953), lançadas em anos anteriores e que tratavam de temas semelhantes.

Belas Artes À La Carte

O filme também impressiona tecnicamente. A fotografia em preto e branco de Kazuo Miyagawa (O Lobo Solitário: O Samurai Assassino) agrada especialmente pelos enquadramentos escolhidos junto a Kurosawa. É comum vermos personagens em um ambiente fechado em primeiro plano, ao mesmo tempo em que enxergamos outra ação acontecendo pela janela, ou pelas frestas na parede, em segundo plano. Essa ação por vezes são personagem passando ou conversando, ou simplesmente a chuva caindo. Detalhes que constroem as cenas de forma singular.

Ainda em ambientes confinados, é comum vermos personagens pensativos ou dialogando de costas um para o outro, enquadrados em planos diferentes e compondo a cena quase milimetricamente, como uma pintura. O mesmo ocorre em planos externos, que valorizam a pequenez dos atores em meio à bela arquitetura nipônica, que enche os olhos de qualquer ocidental que admira a cultura japonesa.

Quem já leu obras como O Preço da Desonra (Kubidai Hikiukenin) - do cultuado mangaká Hiroshi Hirata - lançada no Brasil recentemente pela editora Pipoca e Nanquim, mas publicada originalmente entre 1971 e 1973 no Japão, certamente perceberá como a temática e o tom de Yojimbo as influenciam.

Indo além, é evidente como o trabalho de Kurosawa exerce influência também em cineastas contemporâneos como George Lucas (Star Wars: Uma Nova Esperança) e Quentin Tarantino (Kill Bill: Volume 1), seja em detalhes menores como uma transição de cena, ou em referências mais diretas como a composição de lutas ou uso da trilha sonora.

Aliás, é preciso destacar o trabalho do compositor Masaru Satô (Homem Mau Dorme Bem), colaborador habitual de Kurosawa, que aqui faz um trabalho admirável. Sua trilha dá o tom de quase todos os momentos do filme, indo do humor ao drama, passando pela ação, com fluidez impressionante.

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Dessa forma, minha primeira experiência com Akira Kurosawa não poderia ter sido melhor, já que Yojimbo, o Guarda-Costas se mostra uma obra coesa, que apresenta um protagonista cativante, além de ser tecnicamente impressionante, principalmente quando lembramos que foi filmada no início da década de 1960. Um belo convite para se aventurar em sua vasta filmografia. Em breve, assim espero.

Ótimo


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