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Postado por
Gabriel Galvão
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Direção: Desiree Akhavan
Roteiro: Desiree Akhavan e Cecilia Frugiuele
Elenco: Chloë Grace Moretz, Sasha Lane, Forrest Goodluck, entre outros
Origem: EUA
Ano: 2018
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A seleção de filmes que desponta no Festival de Sundance todo ano reafirma os critérios de curadoria, se tornando uma etiqueta classificatória para as obras que dali se destacam para a carreira de festivais. O Mau Exemplo de Cameron Post (The Miseducation of Cameron Post) segue essa premissa sem inovar muito, mas com o frescor de uma diretora em início de carreia, como Desiree Akhavan, já bem recebida pelo microverso indie por seu longa-metragem de estréia, Uma Boa Menina (Appropriate Behavior, 2014).
A história nos apresenta a Cameron (Chloë Grace Moretz), que, ao ser flagrada no carro se relacionando sexualmente com a rainha do baile, é levada pela tia para o centro de reabilitação homossexual God's Promise. Não há nada abrupto ou inesperado em sua sinopse, tampouco em sua condução, mas ainda assim surge espaço para uma atmosfera estética revigorante. É incerto deduzir o quanto isso infere no trabalho da cineasta, mas é tangível conceber que sua condução como mulher e descendente iraniana tragam uma sensibilidade ainda incipiente na grande indústria a cerca de diversidade de elenco e tópicos.
Enquanto todos os jovens sujeitos a um tratamento sem embasamento lidam das suas próprias formas com o espectro da sexualidade que os assombra pela ótica do castigo cristão, Cameron Post interage, observa, duvida e amadurece. A grande força do filme está nas diferentes maneiras que ela vai encontrando de dialogar com cada um dos colegas de acampamento, mas, provavelmente pela própria natureza de adaptações biográficas, há uma expansão de lugares alcançados e personagens mencionados, porém com pouquíssima profundidade estabelecida para cada um, ao ponto de, quando grandes consequências desse sistema de desvínculos e controle pela culpa afetam um dos rapazes, não temos tempo o bastante enquanto espectadores para apreender seu desencadeamento emocional, apesar de ser precedido por uma sequência montada de forma muito instigante.
É um tanto quanto frustrante, principalmente quando você tem atrizes tão ricas de ferramentas como Sasha Lane (Docinho da América) no elenco coadjuvante, mas não consagra a mesma com mais do que umas concepções unilaterais de uma personagem já pronta e porque é onde o filme mais se permite alegrar-se diante de um ambiente de amor esterilizante. É também onde Chloë Grace Moretz (Se Eu Ficar) tem espaço para apresentar o que é facilmente seu melhor trabalho em longas-metragens até hoje.
Seria um movimento comum à uma obra que inicia um estudo de campo por meio de uma personagem principal nulificar suas nuances, de modo que ela seja um recipiente neutro para todas as experiências, afim de interferir no meio em que foi injetada. O filme de Desiree vai muito além do que essa estrutura sugerida, pois de fato há conflitos em Cameron sobre o que ela acredita, o que ela é, como se sente. Ela não tem suas certezas definidas ainda e está suscetível aos discursos, mas nunca assume que já seja algo ou alguém, podendo selecionar e apurar as vivências com as quais se identifica, mas nem por isso estando em patamar elevado dos outros personagens. Ela é ativamente desafiada a se comunicar, a participar e confessar o que pensa, não podendo apenas ser uma pessoa silenciosa passeando pelos pesares daqueles que observa. Não é seu status de protagonista que a isenta do universo submetido.
Apesar de, em dado momento, Jane (Sasha Lane) soltar um "quem sabe a gente sempre sinta nojo de nós mesmos na adolescência", uma frase de efeito tão esquemática e tão imediatamente direcionada a um público dessa faixa etária que faz questionar o quanto o filme está dialogando com um âmbito mais amplo, a maneira que são representados os irmãos responsáveis pelo centro tem suas conquistas. É muito pouco efetivo somente assumir que aqueles que buscam promover uma política de "correção de gênero", proposta infundada e homofóbica, são vilões com a intensão de manipular suas vítimas inocentes. Acontece que muitos honestamente acreditam estar oferecendo uma salvação, estar seguindo a missão cristã do amor ao próximo. Eles tem argumentos, discursos, convicções. E eles tem amor, o reverendo interpretado por John Gallagher Jr. (Temporário 12) não deixa sombra de dúvidas quanto a isso.
Foto: Divulgação |
Mas é onde o filme se enriquece mais ao dizer: o amor não basta. Amor somente pode ser nocivo e mutilador. Em uma dos momentos mais hipnóticos da obra, em que todo o conjunto da cena e dos personagens se despe de sua roupagem bem humorada para permitir o choro e a angústia, temos a conversa entre Cameron e sua tia. As duas sofrendo e prometendo amar uma a outra, no entanto, é esse afeto desavisado, recoberto por preconceitos sociais e refém de dogmas religiosos obsoletos (e contraditórios, como o filme recorre lembrar), que legitima o abuso psicológico e a destruição pessoal de quem somos em função de sermos servis aos padrões engessados de uma sociedade que não necessariamente queremos entrar, mas que não saberíamos como sair. Tanto porque muitos que amamos ainda vivem nela, quanto porque suas fronteiras não despontam no horizonte.
Mesmo que sigam para longe desta dimensão de carcereiros morais, esses jovens não escaparão tão facilmente do resto do mundo. O final admite uma pequena transgressão ao protocolo dramático e podemos acompanhar os olhares dos amigos até um pouco depois da empolgante trilha sonora final acabar, percebendo ali a excitação do novo rumo, mas a incerteza inevitável do que virá a seguir. Para nós pode parecer que acabou, mas eles sabem a verdade: não acaba. E quanto mais nos resta não ter fim, mais nos aflige o que sucede.
Bom |
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