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Postado por
Gabriel Galvão
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Um dos dois grandes lançamentos de Ridley Scott (Todo o Dinheiro do Mundo) em 2021, Casa Gucci (House of Gucci) é um projeto em andamento há anos, finalmente encontrando as telas de exibição com toda extravagância e presença que seu título evoca. O filme se constrói pelo mesmo argumento do livro no qual se inspira - da autora de Sara Gay Forden -, acompanhando por meio de três grandes arcos a história da família Gucci em meio ao seu império da moda.
Naturalmente, o longa é baseado em eventos reais da crônica familiar que culminam no famoso assassinato do então líder da corporação, Maurizio Gucci, a mando de sua ex-mulher, Patrizia, a quem acompanhamos de certa forma como a protagonista. Como traçar uma relação de causas e consequências tratando da vida real de pessoas que existiram, ou ainda existem - apesar do espírito de Patrizia, ainda viva, ter supostamente habitado o corpo da Lady Gaga (Nasce Uma Estrela) -, é muito mais complicado e facilmente passível de conflitos externos. Casa Gucci precisa caminhar com paciência para chegar ao seu finalmente, sendo a inevitável conclusão reforçada para o espectador desde o princípio.
Maurizio e Patrizia vão se apaixonar, assumir o domínio da dinastia Gucci e viverão um rompimento sórdido que selará seus destinos - ainda que premonições desta fatalidade possam ser pressentidas a todo momento, seja por ironia, seja pelas promessas vagas de uma cartomante. O que fascina no filme de são os caminhos que ele opta ou ignora para chegar até o derradeiro fim.
Universal Pictures |
Um primeiro ato sólido nos introduz Patrizia (Gaga) e Maurizio (Adam Driver) e elucida com alguma sutileza seus contrastes, mas não os torna caricaturas de suas características. Patrizia é, desde o início, deslumbrada pelo poder e riqueza, mas a performance da Gaga nunca faz ela parecer uma mera trapaceira, mas alguém que está de fato apaixonada. Por outro lado, a atuação de Adam Driver (História de um Casamento) oferece um homem tímido, talvez bobo e ingênuo demais para o espectador acreditar que qualquer menino herdeiro pudesse ser assim, mas não impede de sugerir que ele encontra prazer genuíno na vida mais simples que compartilha com a mulher, ao ser deserdado pelo pai, Rodolfo (Jeremy Irons).
As manipulações de Patrizia começam como pequenos charmes e vão engrossando na ousadia conforme ela alcança ferramentas para executar sua vontade. É assim que ela cai nas graças do tio Aldo Gucci (Al Pacino) e convence o marido a alçar cargos cada vez maiores, escalonando o prestígio, mas também os adversários.
Não seria errado dizer que Casa Gucci é uma história de corrupção, afinal a Patrizia realmente se transforma do início ao fim numa mulher sem escrúpulos, mesmo com essa índole presente desde sempre. É sempre interessante observar, porém, que ao lado de uma atuação tão expansiva de Gaga, o Maurizio de Driver vive uma corrupção mais sutil e acovardada, pois, tendo rejeitado a glória familiar no início, encontra um atalho passivo para a riqueza ao apenas se deixar ser persuadido pela esposa e se convencer de que é mera vítima - até, de fato, ser. Contudo, esse também é o problema principal do filme.
A composição pessoal é refinada, mas a direção parece ter deixado cada ator à própria conta, prejudicando imensamente um senso de unidade. A introdução de Paolo Gucci (Jared Leto) é uma evidência maior disso, uma vez que o ator optou por uma das paródias mais ofensivas e absurdas de um italiano, e toda a produção de Casa Gucci parece ter achado muito bom, já que não havia qualquer destino para o personagem além de ser o alívio cômico. Certa cena em que Paolo e Patrizia conversam enquanto os autores disputam qual a falseta de sotaque italiano mais absurda que podem produzir é de um constrangimento hilário digno dos melhores episódios de The Office.
Universal Pictures |
Não é que o personagem não seja engraçado - provavelmente vai arrancar risos involuntários da imensa maioria -, mas o humor quase camp não está conversando com mais nada. Momentos entre Aldo e Paolo saltam aos olhos, porque Al Pacino (O Irlandês) está oferecendo um personagem com modulações amplas, mas está interagindo diretamente com uma paródia. A mesma lógica se aplica à montagem. Depois que o casal se consolida, o filme vai gradativamente se bagunçando entre o que escolhe mostrar e esconder, gerando vários problemas. É muito difícil se localizar na linha do tempo ou na geografia, com tantos cortes bruscos entre Nova York e Milão. Várias cenas são interessantes por si só, muito mais carregadas pelos atores do que por um texto refinado, mas a liga fraca que costura uma sequência à próxima prejudica a lógica central da história. Conflitos surgem e se resolvem num piscar de olhos, inimizades se criam com personagens que na cena anterior eram aliados. O jogo financeiro que assume prioridade no terceiro ato é bastante ininteligível e sai ainda mais lesado pelo modo desinteressante como o próprio Maurizio recebe foco repentinamente - e bem tarde - enquanto Patrizia é largada por muito tempo da trama.
Creio ser fácil intuir que faltou muito foco para escolher qual seria o fio condutor do roteiro, ao invés de gastar muita energia com personagens que não terminam em lugar nenhum. Casa Gucci é um filme que não entendia nunca, afinal está sempre correndo, só está sem fôlego e sem senso algum de direção. É quase como se a produção tivesse se deslumbrado com seus atores e cenas da mesma forma que Patrizia se maravilhou com os Gucci e se lambuzou com a glória. Assim como hoje não há um único membro da família em poder da empresa, a obra perde sua origem por completo, finalizando meio bruscamente mais porque precisava dar um jeito de encerrar aquele compilado de cenas do que por acreditar no poder de síntese de seu encerramento. Já não é uma história que pertence àquelas pessoas.
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