Mad Men 7x14 | Person to Person [Series Finale]


[spoilers]

"Nostalgia. É delicada, mas potente. Teddy me disse que na Grécia, 'nostalgia' literalmente significa 'a dor de uma velha ferida'. É uma pontada em seu coração muito mais poderosa que a memória por si só. Este aparelho não é uma nave espacial, é uma máquina do tempo. Ele vai para trás, para frente... nos leva a lugares que desejamos ir novamente. Nos leva para viajar como uma criança, girando, girando, e voltando para casa, para um lugar onde sabemos que somos amados."

Don Draper (Mad Men, Episódio 1x13, The Wheel)



O monólogo acima, interpretado brilhantemente por Jon Hamm ainda na primeira temporada, traduz um pouco do meu sentimento com o fim de Mad Men. Uma série que hoje está ao lado de obras-primas como The Sopranos ou Breaking Bad, consolidada como um marco da televisão mundial e, seguramente, uma história que guardarei na memória com muita... nostalgia.

Após anos assistindo séries, aprendi que o importante é a jornada, e não somente a conclusão. No entanto, quando vemos um final digno e coerente com a jornada apresentada, tudo se torna mais fantástico e relevante. E não podia esperar menos de uma série que sempre teve o devido cuidado com seu enredo e personagens. Sendo assim, tivemos um final bem delineado para cada uma daquelas pessoas que acompanhamos ao longo de 8 anos. Curiosamente, ou não, apenas Don teve uma conclusão que permite interpretações, mas sobre isso falarei mais adiante.


Não esperava ver Betty novamente nesse capítulo final, pensava que seu último momento seria aquele belo e significativo subir de escadas, sumindo de cena. Porém, que bom que eu estava enganado. Os dois momentos em que a personagem apareceu foram de extrema emoção. Seu último frame foi o de uma mulher que mesmo derrotada pelo câncer, fuma elegantemente seu cigarro, observada ao fundo por Sally, que lava a louça, crescida, adulta. Aliás, a cena em que Sally ajuda o irmão na cozinha foi linda, provando o amadurecimento da menina, algo que vimos acontecer ano a ano. E notaram como a atriz leva a mão à cintura e sorri para falar com o irmão? Um maneirismo que faz parte da composição de January Jones para sua Betty, provando que a filha, ainda que tenha relutado, se assemelha e muito a mãe.

O outro momento (que me destruiu emocionalmente) foi o telefonema de Don. Estava curioso para saber como ele reagiria à notícia da doença da ex-esposa e não foi surpresa perceber que ele largaria tudo para vê-la uma última vez. A decisão de Betty em negar seu pedido, ressaltando que os filhos vivem bem à distância do ex-marido foi um golpe duro, assimilado com dificuldade por Don. Que personagens fantásticos.

"Birdie..."
"Eu sei."

Perceberam como muitos diálogos importantes foram tratados por telefone nesse episódio final? Tomei isso como uma metáfora para a mudança dos tempos, onde cada vez mais estamos distantes e ausentes da vida de quem amamos, tratando assuntos que deviam ser tratados olho a olho, por mensagens no celular, aplicativos e afins. Isso aconteceu novamente para o encerramento de Don e Peggy. Gostaria muito de vê-los se despedindo pessoalmente, mas não foi possível. Ou talvez nem tenha sido uma despedida de fato, se minha interpretação para a cena final estiver correta.


Esse meu ponto de vista me fez empolgar ainda mais com o adorável desfecho de Peggy e Stan, quando o barbudo simplesmente larga o telefone para ir encontrar a amada. Acho que nunca tinha pensado na possibilidade dos dois terminarem juntos, apesar de parecer tudo tão óbvio agora. Os roteiristas nunca fecharam as portas para essa possibilidade, e foi ótimo ter acontecido, pois tratam-se de personagens que se completam em seus ideais. A relação certamente motivou Peggy a recusar a proposta de parceria com Joan, priorizando sua vida pessoal pela primeira vez ao invés da carreira.

Curiosamente essa também foi a decisão que levou Pete a mudar de emprego e de cidade. Ele, aliás, retornou por 2 breves momentos nesse episódio, só para presentar Peggy com um cacto, e provar sua admiração pela companheira de trabalho. Foi um momento singelo, mas de muita beleza. O outro foi ele embarcando com Truddy e a filhinha no avião que os levará embora.

Tudo me pareceu perfeito nesse episódio, sem exageros. Também foi assim quando Roger decide deixar sua herança para seu filho com Joan. Sua relação com a ruiva amadureceu e tivemos a oportunidade de vê-los interagindo com bastante ternura. E foi ótimo ver o carisma de Sterling vir à tona como sempre (o que foi ele chamando o garoto de "little rich bastard"? ). Foi então ser feliz com a mãe de Megan fora do país, ao passo que Joan deu seguimento com seu novo negócio, após ser deixada por seu amante, que queria a mulher como seu bibelô. Inclusive vale citar aqui o contexto histórico, que sempre esteve muito presente em Mad Men. Os anos 70 foi o auge do consumo de cocaína no país, e isso ficou implícito na cena em que ambos cheiram a droga com a mesma naturalidade em que estariam tomando um café.


Por fim, chegamos a Don. Como eu disse na semana passada, não fazia ideia de qual seria o seu desfecho, e foi realmente surpreendente vê-lo encerrar sua participação naquele retiro. A contra gosto a principio, mas completamente entregue na cena final que, aliás, diz muito sobre o que foi esse fantástico personagem. Tenho para mim que o frame final de Mad Men, com um close no rosto de Drapper meditando e dando um sorriso de lábios cerrados, possa ter 2 significados.

Don sempre foi uma figura controversa. Um homem que constituiu família e foi muito bem sucedido no trabalho, mas que nunca foi plenamente feliz. Viver com sua falsa identidade sempre foi um peso difícil de carregar, que parecia não permitir que ele se relacionasse inteiramente com as pessoas. E os poucos momentos em que isso aconteceu, acabaram sendo arruinados por ele próprio. Foi então que, no auge de seu conflito interior (após deixar tudo para trás), ele se viu na figura do homem que falava sobre não se sentir amado. O sonho ali contado pelo estranho fez alusão à própria vida de Don, que por tanto tempo trabalhou para que os produtos nas prateleiras fossem escolhidos pelos consumidores. Teve então a visão de quando a escolha não acontece, teve ali uma visão de si mesmo. Foi quando se levantou e deu o abraço (uma cena poderosa). O sorriso afinal, seria Don encontrando sua paz de espírito.

Por outro lado (o que não apaga a conclusão do parágrafo passado), prefiro acreditar que o sorriso no rosto de Don foi o exato momento em que nosso protagonista teve uma brilhante ideia para o comercial da Coca-Cola. Isso fica evidente quando, após a cena, vemos um clássico comercial do refrigerante encerrar a série que tanto amamos. A marca Coca-Cola foi trabalhada junto ao personagem durante toda a temporada, mesmo que de forma singela. Era uma latinha na mesa de Don, a proposta para ir trabalhar na McCann, a máquina quebrada no motel de beira de estrada. Era como se os produtores associassem a imagem ao personagem, e fizessem questão de nos lembrar disso. Notaram também, como o barulho do sino que inicia a meditação se assemelha muito ao barulho das máquinas de escrever que cansamos de ouvir funcionando na agência? É justamente o barulho que ouvimos no exato momento em que Don sorri.


Um encerramento que foge do óbvio, que nos faz pensar a respeito e discutir (como The Sopranos fez conosco tempos atrás), e portanto, perfeito para a proposta da série.

Está sendo difícil me despedir de Mad Men, mas, assim como Don, faço isso com um sorriso de lábios cerrados no rosto (e com uma lágrima nos olhos, confesso).

"Make it simple, but significant."

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