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Postado por
Gabriel Galvão
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Um dos grandes prazeres da experiência de uma franquia - além do consumo obsessivo, comunidades aficionadas de fãs e esperanças indissolúveis - é o privilégio de acompanhar o procedimento de uma história por meio de anos, através de diferentes obras circundando um universo comum. É um conceito que foi se consolidando no século passado e hoje presenciamos um leque diverso de opções de mundos fantásticos oferecendo inúmeras possibilidades e cenários que, com os anos, podem evoluir seu comentário inicial sobre a realidade usando de artifícios do extraordinário.
O caso do clássico de J.K. Rowling é talvez o expoente máximo da minha geração, nascida nos anos 90, pois não há quem não tenha vivido direta ou indiretamente a consequência da intervenção de Harry Potter na cultura popular mundial, desde o ávido leitor dos livros e produtos derivados até o jovem de óculos e cabelo escuro da sala de aula que inevitavelmente estava condenado ao apelido no primário. Com um saldo em progresso de sete livros oficiais, oito adaptações cinematográficas, uma peça de teatro com ares de fanfic de luxo e a atual série de filmes Animais Fantásticos, com uma média um tanto quanto inconsistente.
Foto: Lúcia Tavares Fotografia |
Para o séquito de fãs que se apaixonaram pelos meandros de um universo suposto e anseiam por sua expansão, talvez fique o contragosto de obras que possam surgir sem de fato acrescentar nada, mas gerando mais consumo. É o que poderíamos chamar de "caça-níquel" e não é um evento incomum no mercado. Mas é de se imaginar que a melhor hipótese envolve tanto um produto de sucesso quanto um novo elemento que se aproprie de características previamente estabelecidas para um argumento diferente.
No Brasil já temos a série de livros Arma Escarlate, que supõe uma narrativa de um jovem negro de favela ao se descobrir bruxo e sendo introduzido à uma escola de magia debaixo do Corcovado. E agora uma nova obra desponta, buscando investigar o cenário que precede a jornada de Harry Potter, onde o totalitarismo político de Voldemort estava em ascensão movido pelo ódio da discriminação contra trouxas, mas encontrando obstáculos na organização estudantil.
No Brasil já temos a série de livros Arma Escarlate, que supõe uma narrativa de um jovem negro de favela ao se descobrir bruxo e sendo introduzido à uma escola de magia debaixo do Corcovado. E agora uma nova obra desponta, buscando investigar o cenário que precede a jornada de Harry Potter, onde o totalitarismo político de Voldemort estava em ascensão movido pelo ódio da discriminação contra trouxas, mas encontrando obstáculos na organização estudantil.
Marotos: Uma História é uma websérie estreante e totalmente independente. Sua existência em si é um comentário reverberante sobre os consideráveis paralelos involuntários entre as camadas políticas fascistas de bruxos puro-sangue e suas elites conservadoras e a situação do Brasil na ditadura militar, uma nação segregada, violada e silenciada por uma normatização que busca beneficiar seu alto clero. Uma sociedade em que a arte é minada e proibida, torna o advento daqueles que optam por criar e se manifestar uma missão quase homérica.
Apesar de a arte estar sempre ao nosso redor e ser um subproduto claro da nossa natureza comunicativa e ansiosa pela expressão, ela também é um alvo fácil de ser atingido por medidas políticas, pelo controle da censura, pela deslegitimação. É contra a violência dos absolutismos que Tiago, Sirius, Remo e Pedro se colocam na websérie que nos conta como os pais de Harry se apaixonaram, como Snape aderiu à Voldemort e como era a relação entre os irmãos Black. As dinâmicas são de curiosidade instantânea para os fãs, mas também podem revelar novos contextos que diversifiquem e enriqueçam o imaginário de questões apontadas pelo mundo bruxo. É nessas novas abordagens do que já está consagrado o espaço em que a websérie dirigida por Nathalia Bottino mais pode tirar frutos proveitosos.
O primeiro episódio, com pré-estréia no último dia 17 de fevereiro em uma sala de cinema do Rio de Janeiro, é mais um tira-gosto do que qualquer coisa, introduzindo o espectador ao tom, ao ambiente que, com todas as limitações de um orçamento quase inexistente, fazem magia em tela aliadas à uma trilha sonora inesperadamente imersiva.
Somos encaminhados pelos corredores da nova releitura de Hogwarts ao grupo de alunos Marotos, travessos membros da Grifinória e seu intempestivo efeito na escola, sempre expansivos, mas afetuosos. Claro que esse afeto também demonstra suas falhas e equívocos naturais de uma adolescência impulsiva, como a forma indevida que Sirius (Chico Suzano) e Tiago (João Pedro Novaes) arriscam cortejar Lílian Evans (Bella Russo). Também já é insinuada a tensão que há entre Tiago e Severo Snape (Leonardo Rocha). O grupo de Marotos tem sua parcela mais suave para equilibrar a dinâmica, com Remo (Ruan Donorato) e Pedro (Ricardo Gaio).
Somos encaminhados pelos corredores da nova releitura de Hogwarts ao grupo de alunos Marotos, travessos membros da Grifinória e seu intempestivo efeito na escola, sempre expansivos, mas afetuosos. Claro que esse afeto também demonstra suas falhas e equívocos naturais de uma adolescência impulsiva, como a forma indevida que Sirius (Chico Suzano) e Tiago (João Pedro Novaes) arriscam cortejar Lílian Evans (Bella Russo). Também já é insinuada a tensão que há entre Tiago e Severo Snape (Leonardo Rocha). O grupo de Marotos tem sua parcela mais suave para equilibrar a dinâmica, com Remo (Ruan Donorato) e Pedro (Ricardo Gaio).
O que também salta aos olhos na série é o envolvimento afetivo que circunda o processo, pois cada ator soa plenamente confortável em seu personagem, evocando um convite amistoso para se introduzir nessa aventura, além de a escolha do elenco ter proveitosamente escapado de preciosismos bobos como buscar personas emulando um fenótipo britânico para apaziguar qualquer exigência arbitrária de fidelidade à obra. Esse tipo de demanda ignora a brasilidade pura do processo e onde Harry Potter, movimentos estudantis e a luta contra um governo opressor e torturador se tangenciam com nossa própria dura memória nacional, tão custosa de se preservar.
A adolescência abraça toda a paixão da luta, mas toda a pulsão do amor romântico, da nobreza à pilhéria. Há uma lacuna muito oportuna para ser preenchida pelo que projetos como esta websérie podem produzir e estimular, cabendo sempre a nós, que cultivamos tanto afeto pelo audiovisual, apoiar e torcer pela expansão de explorações tão apaixonados e dedicadas quanto Marotos: Uma História.
Ainda não sabemos como será o restante da série, mas pontos altos no primeiro episódio são indícios do que podem ser os grandes acertos: dar espaço para a trama política, a interação entre seus personagens diante de uma crise latente, e, principalmente, a inevitável realidade de que se trata de uma obra brasileira e deve ser entendida em seus signos e em sua luta para ser efetuada desta mesma maneira.
Ainda não sabemos como será o restante da série, mas pontos altos no primeiro episódio são indícios do que podem ser os grandes acertos: dar espaço para a trama política, a interação entre seus personagens diante de uma crise latente, e, principalmente, a inevitável realidade de que se trata de uma obra brasileira e deve ser entendida em seus signos e em sua luta para ser efetuada desta mesma maneira.
O Episódio 1, "Eu Juro Solenemente Não Fazer Nada de Bom", estreou no último dia 23 de fevereiro no canal oficial do projeto no YouTube, e você pode conferir logo abaixo!
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