CRÍTICA | Fora de Série

Direção: Olivia Wilde
Roteiro: Emily Halpern, Sarah Haskins, Susanna Fogel e Katie Silberman
Elenco: Kaitlyn Dever, Beanie Feldstein, Jessica Williams, Jason Sudeikis, Lisa Kudrow, Will Forte, entre outros
Origem: EUA
Ano: 2019


As recorrentes comparações que saltam nos fóruns online entre Fora de Série (Booksmart) - longa de estreia da atriz Olivia Wilde (A Vida em Si) como diretora - e a comédia de uma geração todinha, Superbad: É Hoje (2007), não poderiam ser mais precisas e mais distantes. Não só o centro narrativo de ambas as comédias é uma amizade de "desajustados" marginalizados da hierarquia colegial norte-americana clichê, como seus protagonistas são irmãos na vida real, é o caso de Jonah Hill (O Lobo de Wall Street), naquela ocasião, e Beanie Feldstein (Lady Bird: A Hora de Voar), agora. Jonah inclusive ofereceu seu próprio leque de conselhos para a irmã sobre sua experiência em 2007, e Beanie colheu frutos maduros dessa troca.

Em ambos filmes temos um par de amigos dispostos a conquistar o ápice da experiência adolescente como ela nos é prometida por uma artilharia mortal de publicidade desde cedo. A diferença crucial e que evidencia os tempos para os quais ambos estão falando é justamente o gênero que protagoniza esta odisseia. Se em Superbad temos garotos com nenhuma desenvoltura social querendo transar, em Fora de Série temos uma dupla de amigas que se isolaram das visceralidades juvenis para garantir seus futuros em universidades de prestígio, até descobrirem que todos os alunos que passaram o colégio se divertindo também estão com uma vida bem planejada. Desesperadas para compensar o tempo perdido, Amy (Kaitlyn Dever) e Molly (Feldstein) decidem ir para uma festa e cometerem todos os pequenos delitos que rejeitavam.

Foto: Imagem Filmes

As brincadeiras que a obra imediatamente faz com estereótipos, conversa com uma geração que está menos apregoada a valores restritos e personalidades estigmatizadas, onde impera certo nível de fluidez sem se desfazer de fantasias de poder que o espaço colegial promove enquanto metonímia da sociedade e um treinamento prévio para a mesma. As duas protagonistas desfilam sua arrogância intelectual abraçadas na ideia de uma superioridade moral garantida por suas conquistas acadêmicas, mas em pouco tempo esta ilusão se rompe para provocá-las a todo universo do qual se esquivavam.

É preciso dizer, antes de tudo, que a harmonia graciosa com a qual a motivação de ambas é elaborada torna todo o restante do filme de extrema identificação, mas são também as nuances entre ambas que dá corpo à melhor parte da obra: a amizade entre elas. Molly tem um desejo frustrado de liderança e se reprime sexualmente, enquanto Amy protagoniza uma das viradas mais hilárias do longa quando a amiga pergunta para ela sobre seu interesse amoroso, e ela vira com um olhar apaixonado para alguém em slow motion em um skate. Sequência que o público já viu à exaustão e reconhece de imediato, até que a câmera sobe e revela a paixão da garota como uma menina de cabelos loiros cacheados e uma aparência nada normativa. É uma gag simples, inteligente, mas que sintetiza a cadência inteira do humor disposto em tela.

Além de sacadas espertinhas, Fora de Série abraça o humor do absurdo com a apresentação excepcional de Billie Lourd (Star Wars: O Despertar da Força) - que já tinha se provado hilária em Scream Queens (2015-2016), e aqui se supera - como um pastiche de manic pixie dream girl drogada e nonsense. Produtores independentes precisam convidá-la mais vezes para papéis de comédia, é histérico de tão bom. Mesmo com este destaque, todo o resto do elenco está tão claramente confortável em participar daquele grupo que toda comédia e cacoetes de cada pequeno personagem soam orgânicos e se comunicam com aquele microverso. Para uma comédia tão despretensiosa e não necessariamente vanguardista, é fascinante o quão convidativa é capaz de tornar a pequena aventura desajeitada de duas nerds. O protagonismo feminino e a inclusão natural de personagens LGBT não são as pautas principais aqui, mas engradecem cada relação apresentada e situação ocorrida com elegância e uma nova complexidade juvenil aqui capturada.

Foto: Imagem Filmes

Ainda que muitas piadas sejam óbvias e o ritmo tenha uma queda quando se torna muito esquemático, Fora de Série é uma maneira muito saudável e promissora de se apresentar personagens e oferecer comédia. Só podemos esperar que a ótima repercussão do longa-metram promova outros semelhantes e ao mesmo tempo diversos.

Ótimo

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