CRÍTICA | Não Mexa Com Ela

Direção: Michal Aviad
Roteiro: Michal Aviad, Sharon Azulay Eyal e Michal Vinik
Elenco: Liron Ben-Shlush, Menashe Noy, Oshri Cohen, entre outros
Origem: Israel
Ano: 2018


Não Mexa Com Ela (Isha Ovedet) acompanha a jornada de Orna Haviv (Liron Ben-Shlush) na tentativa de se re-inserir no mercado de trabalho para consolidar economicamente seu núcleo familiar, agora que começaram, ela e o marido, a empreitada de abrir um restaurante. Rapidamente ela assume um cargo de respeito como assistente em uma construtora na cidade, vendendo prédios para estrangeiros. Sua boa articulação com clientes franceses chama atenção e rapidamente ela se torna objeto de interesse de seu chefe Benny (Menashe Noy). Interesse esse que, em pouco tempo, se revela coberto de intensões sexuais, e é aqui que nossa história de fato começa.

Desde o primeiro momento, quando Orna é apresentada ao seu superior profissional e escuta sobra a admiração que há por ele no local, são instaladas as primeiras grades de uma jaula que vai se estendendo em seu entorno. O olhar da personagem gradualmente acompanha as suspeitas de que algo está em andamento, uma espécie de silenciosa avaliação por parte de Benny sobre até onde consegue aproxima-la dele, um teste salpicado em pequenos pedidos como que solte seu cabelo, utilize outra roupa, acompanhe ele até um lugar de difícil acesso. Assim, sem nunca verbalizar, ele está verificando o momento certo para dar o bote. Orna está tentando equilibrar a insipiente compreensão deste assédio com seu vigor para crescer no ambiente de trabalho e sua dedicação interpretada como reciprocidade por quem vê o que quer.

Foto: Pagu Pictures

A diretora Michal Aviad (For My Children) é engenhosa no fôlego que fornece em cena para a posterioridade de cada ação, deixando que nas inflexões de sua protagonista se esclareça um corpo revestido de precauções frágeis contra os movimentos ambíguos dos homens ao seu redor. É uma compreensão essencialmente eficiente das defesas tímidas que com muito esforço se erguem para a proteção de algo com gosto de inevitável e irremediável. Mesmo depois de uma primeira investida mal sucedida e parcamente superada, a relação entre Orna e Benny permanece carregada de um mau agouro presente a todo momento, tornando mesmo cenas em planos abertos claustrofóbicas.

Isso se deve principalmente a um ótimo trabalho de câmera em que em muitos momentos a ação se desenvolve no espaço entre as paredes de um corredor. A eficácia desses enquadramentos permitirem a noção visual de um espaço encerrado como um beco sem saída. A presença parcial de corredores sugere que a personagem chegou caminhando até ali, e se não vê como retornar, é tanto uma situação interna dela quanto uma imposição dos ângulos. É facilmente a parte mais inventiva do filme, uma vez que fora a boa direção e boas atuações para desenvolver a desconfiança e o assédio sexual em ambiente profissional.

O roteiro, por outro lado, peca muito em seu terceiro ato. De um instante para o outro a decoupagem temporal muda drasticamente e eventos relevantes são deixados de lado e subentendidos, anulando momentos essenciais para a discussão sobre o abuso vivido por Orna. Exemplo disso é uma elipse que devora seu pedido de demissão e subsequente vida desempregada.

Benny é um homem ovacionado em seu ambiente profissional, então qual o espaço de Orna para expor ele sem sofrer pela descrença e retaliação? Mesmo que ela não se posicione sobre isso, o homem se recusa a emitir uma carta de recomendação, condição essencial para que consiga outro emprego na área. Ou seja, mesmo que ela tenha optado por não embarcar no conflito - o que contradiz completamente o subtexto do filme como sua sinopse, sua divulgação - ainda sofre consequências de ter sido abusada sem que a obra ofereça nenhuma consequência para seu agressor.

Foto: Pagu Pictures

O que poderia ser um comentário anti-climático, cruel e competente sobre como homens em cargos de poder costumam se safar de situações escabrosas - simplesmente pela sistemática que os eleva também a os tornar intocáveis - se torna uma conclusão equivocada sobre as sequelas de um episódio de estupro. O gosto insalubre que fica é a de que a protagonista permanece refém, uma vítima calada, desistente de uma luta real sobre seus próprios direitos para se contentar com pequenos triunfos enganosos em sua condição.

Vale citar também que a tradução do título para o Brasil, Não Mexa Com Ela, reforça a ideia de uma mulher combativa que "não vai deixar barato", imagem que o filme em si (cujo título hebraico é mais algo como "Mulher Trabalhadora") pouco trás.

Bom

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