CRÍTICA | A Despedida

Direção: Lulu Wang
Roteiro: Lulu Wang
Elenco: Awkwafina, Shuzhen Zhao, Tzi Ma, Diana Lin, entre outros
Origem: EUA / China
Ano: 2019

Quando pensamos na existência em si, nada é muito certo, não é mesmo? A não ser a morte, uma das únicas certezas que nos acompanha desde o primeiro respiro de vida e que segue sempre presente e se transformando em distintos conceitos conforme vamos crescendo. Se nos primeiros anos de vida somos incapazes de entender seu significado, isso muda totalmente quando nos deparamos com a primeira perda. E claro, cada um tem sua própria maneira de lidar com tudo isso. Religião, cultura, filosofia, maturidade... Não há uma fórmula certa para compreender algo tão complexo. E A Despedida (The Farewell) traz uma abordagem necessária que nos ajuda a ampliar nossa concepção de morte e perda.

A roteirista e diretora Lulu Wang (Póstumo) faz uso de uma experiência pessoal para nos mostrar como Billi (Awkwafina) e seus parentes pretendem lidar com a abrupta notícia de que Nai Nai (Zhao Shuzen), a matriarca da família, está com um câncer de pulmão em estágio avançado.

Inspirada na própria Wang, Billi é uma chinesa de 30 anos que, ainda criança, foi morar nos Estados Unidos com os pais. Distante de sua família, entendemos que a jovem se adapta ao estilo de vida na América, mas ainda mantém uma forte ligação com sua avó mesmo à distância. Porém, quando a família descobre a doença de Nai Nai, fica decidido que ninguém contará a verdade a ela - e um casamento falso será a desculpa perfeita para unir a família em tom de despedida.

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A doença de Nai Nai é o ponto chave para entendermos praticamente todos os personagens e a forma peculiar como cada um escolhe agir diante da perda de um familiar. Na China é preferível que a pessoa doente não saiba que tem câncer, e é dessa forma que os filhos e a irmã de Nai Nai vão agir. Mas Billi, criada distante desse pensamento, encontra dificuldade em aceitar esse tipo de segredo. A jovem não pensa duas vezes em seguir viagem para sua terra natal e se reconectar com o ambiente e com as pessoas que fizeram parte de sua infância, mas precisará encarar um lugar que continua o mesmo, embora ela tenha mudado bastante por conta de sua vida em outro país.

A mentira com o objetivo de tirar qualquer tipo de peso que possa afetar negativamente o fim da vida da matriarca é sustentada, ao passo que começamos a nos questionar até que ponto esse tipo de decisão realmente é aceitável. Será que realmente há algum tipo de mentira com um propósito que a justifique, mesmo que esta ultrapasse limites éticos e morais de decisão e escolha do próprio indivíduo? Será que gostaríamos de sermos poupados da trágica verdade, se houvesse a possibilidade?

A todo momento os personagens serão donos e vítimas de suas decisões, já que as consequências de ocultar a verdade são inevitáveis em seu íntimo. Cada um deverá arcar com o tipo de culpa que consegue carregar diante daquilo que acreditam ser o melhor para o coletivo, pois assim foram criados.  Criação é uma palavra forte ao longo do filme, pois é através da experiência ocidental e oriental de Billi que o leque se expande e nos mostra que sempre há, pelo menos, dois lados a serem considerados.

Apesar da morte ser um tema presente, A Despedida também é sobre amor. Amor e suas diversas formas de demonstração, de cuidado e das dificuldades em transpô-lo. A famosa frieza das relações orientais é evidente, mas a vida no Ocidente também não se mostra muito diferente quando vemos a dureza do dia-a-dia da Billi adulta em busca de sonhos.

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A escolha pela predominância de tons mais azulados e cores opacas lembra um congelamento de afetos, algo que só deixamos de sentir na presença de Nai Nai, justamente a representação amorosa que deixará a vida de todos aqueles personagens e que parece ser o último elo de amor que liga todas aquelas pessoas de alguma forma. O amor é demonstrado também nas decisões difíceis, na própria mentira, mas Nai Nai está lá pra lembrar que também precisamos colocar esse sentimento pra fora, no toque e nas palavras.

Ótimo


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