CRÍTICA | O Filme da Minha Vida

Direção: Selton Mello
Roteiro: Selton Mello e Marcelo Vindicato
Elenco: Johnny Massaro, Selton Mello, Vincent Cassel, Bruna Linzmeyer, Antonio Skármeta, Bia Arantes, Rolando Boldrin, entre outros
Ano: 2017
Origem: Brasil

“Por que foi embora?”

Essa é a pergunta que atormenta o protagonista do novo longa-metragem de Selton Mello (O Palhaço).

O Filme da Minha Vida é baseado no livro Um Pai de Cinema, do autor chileno Antonio Skármeta, e conta a história de Tony Terranova (Johnny Massaro), filho de pai francês e mãe brasileira, que retorna dos estudos na capital quando seu pai (Vincent Cassel) abandona a família, partindo no mesmo trem que o trouxe para casa. O garoto então se torna nostálgico e melancólico, esperando notícias ou o entendimento desse abandono. A história se passa numa cidade pequena na Serra Gaúcha, no ano de 1963.

Encantado pelos livros e pelo cinema, Tony é sensível e faz do amor, da poesia e da arte cinematográfica suas grandes razões de viver. Ele é professor de francês do colégio da cidade, lida com os conflitos da adolescência de seus alunos e descobre o amor, e o sexo. Leva sua rotina dando aulas, ajudando sua mãe que foi abandonada pelo marido e tentando conquistar a moça que ama. A verdade sobre seu pai então começa a se revelar, o obrigando a tomar uma posição sobre sua trajetória.


Johnny Massaro (A Frente Fria Que a Chuva Traz) tem toda a doçura, a melancolia e o “tom poético” que o personagem exige. Ele fala como se tivesse declamando um poema, principalmente nas cenas em que narra a história. Os olhos de Tony estão descobrindo o encanto e o surrealismo que a vida traz.

Segundo Antonio Skármeta, Um Pai de Cinema se passa em uma época indefinida, onde não existem os barulhos da modernidade ou tudo que distrai a vida íntima das pessoas, como a televisão e a internet. É um tempo e lugar em que se pode ouvir a batida dos corações dos personagens.  O autor afirmou que sempre quis ver o filme rodado no Brasil e falado em português.

“Busquei esta América Latina que existe nas pequenas cidades, onde os personagens têm desejos, ambições, grandes frustrações, onde um gesto pode ser para toda a vida, onde um fracasso pode ser uma tragédia, onde há uma distância muito grande entre a realidade e os sonhos”. 

Desde que se lançou como diretor e produtor, Selton Mello tem se mostrado bem sucedido em sua empreitada, O Filme da Minha Vida ratifica essa afirmação. Ele se encantou com a história e quis contá-la como se fosse dele. O longa mantém o estilo de Selton, conciliando cinema autoral e diálogo forte com o público. Ele trabalha com drama, mas não deixa de lado o humor, a ironia, e o alívio cômico, que neste caso, aparece nos alunos de Tony, com os hormônios à flor da pele e que querem de qualquer jeito perder a virgindade. Esta é uma história de amor, em que os elementos vão se misturando. É uma história de reviravoltas surpreendentes. 


O filme é bem estruturado, construído com transições inteligentes através de diálogos e cenas intercaladas por elementos da narrativa. Tem um ritmo agradável, uma sensação de nostalgia através de flashbacks e uma trilha sonora bem direcionada, e o humor e a sexualidade na dose certa.

Todos os peronagens roubam a cena, incluindo os secundários e coadjuvantes, como Luna (Bruna Linzmeyer), silenciosa e com seus olhos azuis, que encanta o protagonista e o espectador, misturando sensualidade e doçura. Assim como Tony, é sonhadora, apresenta um certo lirismo em sua fala, e diz que o que mais gosta no mundo é imaginar. Contracenando com ela, há sua irmã, Petra (Bia Arantes), que traz um tanto de mistério e sedução, que é explicado com o desenrolar da história.

Selton também volta a atuar, como Paco, amigo da família de Tony. Com uma interpretação singular, ele usa sua voz empostada e mais grave, com diálogos inteligentes e que trazem humor. Em seus filmes, ele costuma convidar atores afastados da grande tela, como Rolando Boldrin (O Tronco), o maquinista do trem. Um personagem com poucas aparições, mas que apresenta simbolismos e olhares, e a tarefa de levar as pessoas para resolverem as coisas. 

E não dá pra esquecer de Vincent Cassel (Cisne Negro), o mais brasileiro dos franceses. Sempre imponente em tela, expressando emoções com um olhar, de ternura, de arrependimento, de tristeza, de vergonha. Aliás, Selton valoriza o trabalho de seu elenco com enquadramentos ultra fechados, fazendo quase um plano detalhe do rosto dos atores, como se levasse o espectador a entrar em seus pensamentos.


Outro destaque é a fotografia deslumbrante de Walter Carvalho (Heleno), com imagens encantadoras, quase oníricas. Há um harmonia perfeita com a visão de Selton Mello, e tudo é esteticamente lindo de se ver, principalmente a cena do ensaio de dança das garotas, que é uma das mais belas do longa.

Acredito que a obra retrata a importância da paternidade e da família no amadurecimento dos jovens, tanto no aspecto emocional quanto sexual. Tony passa por essa transição para vida adulta e enfrenta uma inadequação no mundo, a falta do pai e a dúvida do que sonha para sua vida. É uma história onírica com uma mensagem linda, terna e íntima, que faz o espectador sonhar e entrar nesse universo próprio de Selton Mello sem querer sair.

Mas o final, eu não posso contar.

Excelente

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