CRÍTICA | A Pé Ele Não Vai Longe

Direção: Gus Van Sant
Roteiro: Gus Van Sant
Elenco: Joaquin Phoenix, Jonah Hill, Rooney Mara, Jack Black, entre outros
Origem: França / EUA
Ano: 2018


Gus Van Sant (Gênio Indomável) tem uma bondade que é indissociável de seus trabalhos. É incrível como, mesmo em seus filmes com temas mais sórdidos e conclusões mais brutais ainda sobra uma atmosfera resiliente e piedosa com seus personagens. Não há um julgamento de caráter, mas acima disso, um sentimento de acolhimento e espanto que não lhe escapa nem em Elefante (2003), Paranoid Park (2007) ou Garotos de Programa (1991), e certamente prossegue aqui.

O diretor já provou ser capaz de oferecer uma linguagem mais metódica e palatável, imiscuída em seus impulsos de filme de baixo orçamento, mais experimentais e autocentrados, como em Milk: A voz da Igualdade (2008). Até porque um desafio imediato de uma cinebiografia é o método adotado pelo qual se observar a vida do objeto principal. Uma vida inteira é palco para uma quantidade infinita de experiências e avaliações, naturalmente impossível de comportar em um longa-metragem.

A escolha de A Pé Ele Não Vai Longe (Don't Worry, He Won't Get Far on Foot) é transitar temporalmente entre um John Callahan (Joaquin Phoenix) antes e depois de um acidente irresponsável que o deixou tetraplégico.

Foto: Diamond Films

As sequências são untadas pelo mesmo sentimento de perda e vícios do protagonista enquanto trafega por uma procura nebulosa de um propósito quando tudo de si já lhe foi tirado. Callahan, que viria a se tornar um cartunista de humor negro famoso, não passa impunemente pelas suas escolhas e a obra tem a generosidade de observar isso, apesar de reinar o beabá da estrutura de cinebiografia, delineando uma cronologia frágil para o personagem (mas fingindo que não, ao usar do artifício de embaralhar a ordem dos eventos).

É curioso como o que mais pode enfraquecer o filme ao gosto do espectador é justamente o nome de direção que carrega, por ser extremamente desapontante ver um trabalho tão morno de um diretor como Gus Van Sant, sem muita criatividade ou desafios para seus atores. Ninguém ali cresce muito para além de um conjunto de compleições da mise-en-scene, permanecendo estáticos à platéia (ironia cruel diante do título adotado). Principalmente porque o diretor norte-americano já provou ser capaz de trabalhos muito mais inspirados, aqui o tempo se arrasta folgado.

A etiqueta do "baseado em uma história real" é uma armadilha ardilosa que seduz uma produção inteira a se vestir e resguardar-se de ousadias, sem espaço para vulnerabilidades e riscos nus expostos. Aqui esse truque é bem sucedido e temos um arroz com feijão de sessão da tarde que, muito brevemente, se permite inspirações (como o recurso de animar as charges de Callahan), por mais boas intenções que o rondem.

Foto: Diamond Films

A intensão de ter sempre Callahan como epicentro e seus personagens secundários como elementos eventuais que só despontam quando tem alguma utilidade para os descobrimentos do protagonista, nulifica a complexidade dessas relações e dos encontros e desencontros entre humanos. Acabamos perdendo a oportunidade, por exemplo, de ter mais de um trabalho tão inusitado de Jonah Hill (O Lobo de Wall Street), uma vez que seu personagem só oferta frases e depoimentos engraçados ao personagem de Joaquin Phoenix (Ela) para no final morrer em voice-over.

Não é, em definitivo, uma obra negativa, mas para Gus Van Sant é um trabalho desempolgado.

Regular

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