CRÍTICA | O Castelo Animado

Direção: Hayao Miyazaki
Roteiro: Hayao Miyazaki
Elenco: Chieko Baishô, Takuya Kimura, Tatsuya Gashûin, entre outros
Origem: Japão
Ano: 2004


Do visual deslumbrante à uma das trilhas sonoras mais marcantes do Studio Ghibli. O Castelo Animado (Hauru no ugoku shiro) é um dos filmes mais fantásticos de Hayao Miyazaki (Princesa Mononoke) e com certeza está, não somente entre as melhores animações do estúdio, como muito bem posicionada na prateleira junto das mais singulares que assisti até hoje.

Baseada no livro homônimo - Howl's Moving Castle, 1986 - da autora inglesa Diana Wynne Jones, a história é ambientada em um universo onde magos e feiticeiros são figuras muito presentes na sociedade. Sophie (Chieko Baishô), uma singela chapeleira que nos guia pelo conto, é o oposto disso tudo. Simples, vive uma vida comum trabalhando em um negócio de família, nunca almejando nada fora do pequeno quarto onde costura.

Após ter um encontro inesperado com o famoso feiticeiro Howl (Takuya Kimura), ela recebe a visita da Bruxa da Terra Abandonada (Akihiro Miwa), que lança uma maldição que a transforma em uma senhora. Ver a sua vida mudar radicalmente tão rápido só lhe da uma saída: um reencontro com Howl pode ser sua melhor chance de reverter a maldição.

Foto: Studio Ghibli

Miyazaki é conhecido pela criatividade visual e a riqueza de detalhes com que imagina cada universo e personagem de seus filmes. Apesar de, neste caso, tratar-se de uma adaptação de uma obra que não é de sua autoria, sua visão dá ao conto a singularidade que esperamos de seus trabalhos. Em especial, nada se compara ao esmero que é a construção do Castelo Animado. A moradia/transporte de Howl é o coração da história e, caso não funcionasse, todo o restante ruiria. Não a toa ele é a primeira e a última coisa que vemos no longa.

Além de visualmente único, o castelo simboliza muito da emoção da produção. Quando Sophie o encontra pela primeira vez, assim como ela ainda está com seus pensamentos encobertos de incertezas e dúvidas, todo o interior do lugar está sujo e desorganizado. Ou, quando os personagens estão fragilizados em certo momento da trama, o próprio castelo está em ruínas, desencaixado.

“Somos uma família improvável.”

É o que diz Howl para as pessoas a sua volta. Tal qual as peças que formam o castelo, ninguém ali parecia capaz de se encaixar. Porém, juntos, eles surpreendentemente funcionam, em uma harmonia única.

É interessante também notar como a animação usa de analogias visuais para demonstrar os sentimentos. Seja nas transformações do feiticeiro ou na própria maldição que atua no corpo da garota. Enquanto Howl, ao se entregar ao amor, fica cada vez mais exposto a sua face monstruosa, Sophie, por sua vez, alterna entre senhora e a sua verdadeira forma, de acordo com o que ela mesmo se enxerga ou o seu estado de espírito do momento.

Foto: Studio Ghibli

Em meio a tantas metáforas, Miyazaki é bem direto quando se trata da guerra. Tema recorrente em seus filmes, aqui a história se passa em meio a uma, onde cada reino recruta feiticeiros para aumentar ainda mais o seu poder de destruição em massa. O diretor abusa de tomadas longas de destruição e de mostrar, mesmo que através de monstros e aviões fantásticos, toda a dor e morte que situações como essa trazem para todos, até para os que não estão envolvidos diretamente no conflito.

No contraponto, é bonito como ele também trabalha muito bem o protagonismo de Sophie. Em meio a guerra e seres mágicos extremamente poderosos e mortais, a garota em corpo de senhora abre os caminhos com um coração grande e a simples vontade de fazer o bem e proteger aqueles que precisam. Mesmo diante de um dos feiticeiros mais poderosos, ela não se intimida ou faz nada em troca de apenas agradá-lo. Ela é dona da própria história.

E se há outro responsável em fazer esse castelo alçar vôos ainda maiores, que me desculpe Calcifer, este alguém é Joe Hisaishi (Porco Rosso: O Último Herói Romântico). Ao lado da trilha de A Viagem de Chihiro (2001) este é um dos melhores trabalhos já feitos pelo compositor. A composição "Merry Go Round of Life", tema da obra, é primorosa e faz sentir aquele calor bom no peito toda vez que e a ouço.

Muitos foram os finais que escrevi pra esse texto. Assim como a desengonçada casa andante, todos pareciam não encaixar ou não fazerem jus ao sentimento que essa produção me traz. Se o Studio Ghibli simboliza boa parte do meu amor e fascínio pelas animações, com certeza O Castelo Animado é um dos grandes responsáveis por isso.

Excelente


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Eduardo é jornalista, tem o Castelo Animado tatuado e escreveu ao som de "Merry Go Round of Life".

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